15.6.15

Joyce

Todo o virtuosismo técnico de Ulysses não nos deve fazer esquecer a baixeza da matéria que o compõe. Pode ser que o livro esteja repleto de charadas eruditas — como se gosta de lembrar —, mas tanto quanto de imagens do mais profundo mau gosto. Por exemplo, esse trecho tão engenhosamente executado, em que a leitura de um jornal é apresentada em paralelo — ou em que a redação da imprensa diária é igualada — ao ato de... bem, leiam vocês, na pioneira tradução do Houaiss:
Refestelado no trono desdobrou o jornal virando as páginas sobre os joelhos nus. Algo novo e fácil. Não há grande pressa. Demorar-se um pouco. Nossa novidade premiada. O golpe-de-mestre de Matcham. Escrito pelo senhor Philip Beaufoy, clube dos Playgoers, Londres. Pagamento à razão de um guinéu por coluna foi feito ao autor. Três e meia. Três libras e três. Três libras treze e seis.
Calmamente ele lia, dominando-se, a primeira coluna e, cedendo mas resistindo, começou a segunda. A meio, uma última resistência cedendo, permitiu que os seus intestinos se aliviassem de todo enquanto lia, lendo ainda pacientemente, toda ida aquela ligeira prisão de ventre de ontem. Espero não seja demasiado grosso e provocar hemorroidas de novo. Não, está exato. Assim. Ah! Constipado, uma tablete de cáscara sagrada. Vida podia ser assim. Aquilo nem o agitava nem o comovia, mas era algo rápido e limpo. Imprime-se qualquer coisa hoje em dia. Época idiota. Lia adiante sentado calmo sobre o próprio odor montante. Limpo certamente. Matcham pensa frequentemente no golpe-de-mestre com que ganhou dessa bruxa gargalhante que agora. Começa e termina moralmente. A mão na mão. Sagaz. Remirou o que lera e, no que sentia verter sua água calmamente, invejou com carinho o senhor Beaufoy que escrevera aquilo e recebera de pagamento três libras treze e seis.